O Congresso brasileiro não se mexeu para declarar o
impeachment da presidente Dilma Rousseff, que está sob ataque , mas em uma
favela que leva seu nome ela já foi deposta.
Como a inflação mais acelerada em mais de uma década atinge
mais os pobres do que os ricos, no mês passado um líder da Comunidade Dilma
Rousseff arrancou a placa em homenagem à presidente da entrada da favela,
situada ao lado de uma rodovia no Rio de Janeiro.
“Colocamos a placa quando Dilma foi eleita, achando que ia
valer alguma coisa, mas não aconteceu absolutamente nada”, disse Marilene Silva
Souza, 40, que vende biscoitos e garrafas de água na estrada.
“Estamos comendo restos. Se você quiser comer um pouco
melhor, tem que pagar um absurdo”.
Desde que o segundo mandato de Dilma começou, em janeiro, o
governo aumentou os preços regulados pelo governo, o que, junto com o aumento
do custo dos alimentos, ajudou a impulsionar a inflação para quase o dobro da
meta oficial. O resultado é um aperto para os pobres, que formam a base do
Partido dos Trabalhadores de Dilma Rousseff e se voltaram contra ela em maior
número do que a população que goza de melhores condições de vida.
“A inflação é, por natureza, um imposto regressivo e os
preços aumentaram mais rapidamente na cesta de bens e serviços consumidos pelos
pobres”, disse Alberto Ramos, economista-chefe para a América Latina do Goldman
Sachs Group Inc., em uma entrevista por telefone. “Eles estão sendo duplamente
atingidos”.
A assessoria de imprensa da Presidência não fez nenhum
comentário sobre o impacto da inflação na popularidade do governo entre os
brasileiros de baixa renda.
Índice de referência
A inflação do Brasil, medida pelo índice de referência IPCA,
acelerou para 8,89 por cento nos 12 meses até junho, segundo dados publicados
nesta quarta-feira.
O IPCA mede o aumento dos preços para as famílias que ganham
até 40 salários mínimos, atualmente R$ 31.520 (cerca de US$ 9.800) por mês.
Desde março, os preços dos bens que têm um peso maior para
as famílias de baixa renda, como cebola, carne e eletricidade, estão
ultrapassando o indicador principal.
O índice INPC, que calcula a inflação para as famílias que
ganham até cinco salários mínimos, aumentou 9,31 por cento em junho e avançou
10,72 por cento no Rio de Janeiro.
Na Comunidade Dilma Rousseff, o chão está cheio de lixo
queimado e pedaços de tijolos. A placa em homenagem a Dilma está jogada ali
desde 26 de junho, dia em que a revista Veja publicou uma matéria sobre
supostas doações ilegais feitas à campanha de reeleição da presidente em 2014 e
reinflamou os pedidos de impeachment.
“Eu tirei a placa com raiva, com tristeza, com desgosto, e
aborrecido”, disse o pastor Vagner Gonzaga, líder da comunidade, em uma
entrevista em sua igreja. “Eu disse: ‘Isso acaba aqui’. Acabou a associação.
Acabou. Acabou Dilma Rousseff”.
Tarifa de eletricidade
O custo da eletricidade, medido conforme o índice INPC,
aumentou 41.5 por cento nos seis primeiros meses do ano. A tarifa dos ônibus
urbanos subiu mais de 12,5 por cento, o feijão, até 24,5 por cento, e os ovos,
13,3 por cento.
Os preços da cebola e do tomate dispararam 151 por cento e
59,1 por cento, respectivamente.
Desde dezembro, a aprovação do governo Dilma caiu 31 pontos
porcentuais, para 10 por cento entre os que ganham o equivalente a cinco
salários mínimos ou menos, de acordo com o Ibope.
A taxa de aprovação do governo é de 9 por cento, de acordo
com uma pesquisa realizada pelo Ibope entre os dias 18 a 21 de junho, com uma
margem de erro de mais ou menos dois pontos porcentuais. A taxa é pior que a do
governo de Fernando Collor, que renunciou em 1992 em meio a um processo de
impeachment.
Se dependesse do pastor Gonzaga, ele faria o impeachment de
Dilma “urgentemente”.
“Agora eu sou anti-Dilma, anti-Lula”, disse Gonzaga,
referindo-se ao antecessor de Dilma, Luiz Inácio Lula da Silva, cujo governo
tinha uma taxa de aprovação de 80 por cento no fim do segundo mandato. “Eu
acreditei que esse governo era para os pobres”.
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